Agnes Brichta, a Tina de Quanto Mais Vida, Melhor! Talento e determinação além do sobrenome

Com formação teatral, atriz faz bonito em estreia na TV e exalta referência em casa de Vladimir Brichta e Adriana Esteves


22 de dezembro de 2021 03h43

Foto: Divulgação

Por Luciana Marques

*A entrevista completa está disponível no vídeo, abaixo.

Quem tem a oportunidade de conversar com Agnes Brichta de cara percebe o quanto ela é diferente da esquentada Martina, sua personagem em Quanto Mais Vida, Melhor! Com jeito doce e de fala tranquila, a atriz de 24 anos, formada em Psicologia, diz preferir sempre o diálogo. Mas adianta o que vai levar da jovem: a assertividade. “Acho que consegui trazer isso dela e espero que permaneça comigo, porque tem seu trunfo também, saber o que quer, conseguir colocar o pé no chão, com certeza e sem medo do que as pessoas podem pensar”.

A conquista do papel não veio de forma fácil. Agnes participou de um evento online de fim de curso da CAL, com 150 alunos, para produtores. A sua performance chamou a atenção de um produtor da trama das 7 da Globo, que precisava de uma atriz com o seu perfil para viver Martina. E somente ao final, quando a chamou para o teste, viu na lista o seu sobrenome e ficou sabendo que ela era filha de Vladimir Brichta, ator que faria o Neném, pai da personagem. Um tempo depois, após mais testes, ela já estava gravando com o pai e fazendo a sua estreia no audiovisual. “O meu pai respeitou o meu espaço de descoberta, era um trabalho subjetivo”, conta.

Agnes tem se destacado e mostrado segurança em sequências sensíveis com o próprio pai e também nas de rixa com Soraia (Camila Rocha). Muito disso por conta do estofo dado por anos de cursos de teatro nas mais tradicionais escolas cariocas, como Tablado e CAL. Na trama, o casal birrento vivido por sua personagem e Antonio/Tigrão (Matheus Abreu) já ganhou a torcida do público e até a hashtag #tigrina. “Eles estão sempre acostumados a brigar e a outra pessoa a recuar e, de repente, eles brigam e a outra pessoa responde. Isso instiga!”, avalia.

Agnes, que perdeu a mãe, Gena Ribeiro, aos 2 anos, foi criada por Vladimir e Adriana Esteves, com quem o ator é casado desde 2006 e a quem a jovem chama de mãe. Ela vive com os pais e os irmãos Vicente, de 15 anos, filho do casal, e que até a fotografou em um registro publicado na matéria, e o músico Felipe Ricca, de 21, da união de Adriana com Marco Ricca. Na entrevista, Agnes fala da troca com o pai em cena e conta como ele e Adriana estão vendo a sua estreia. A jovem diz também o quanto o exemplo de amor e entrega deles à carreira foi fundamental para o seu entendimento da profissão.

Martina (Agnes Brichta). Foto: Globo/Fabio Rocha

Como surgiu a oportunidade para a novela? Eu estudo teatro na CAL (Casa das Artes de Laranjeiras) e quando vai chegando no final, a escola promove um encontro com produtores e a turma inteira se apresenta. Por conta da pandemia, a gente fez online, o que teve lá o seu ganho. A princípio, a gente apresentava uma cena de teatro, e nesse ano, a gente teve a oportunidade de fazer monólogos e textos audiovisuais. E deu uma resposta boa para a turma. Um dos produtores que estava lá é o Guilherme Gobbi, produtor de elenco da novela. Ele me viu e achou que eu tinha uma idade parecida com a da personagem. E no teste eu falava de um tema parecido com o da trama, de relação pai e filha. Casou mais do que eu poderia imaginar. E aí ele achou que eu poderia ser chamada para o teste para a novela. E depois que ele viu o meu sobrenome e disse, peraí, é o mesmo do ator que já está contratado para fazer o pai. Tinham muitos alunos lá, 150, só no final dizia, ah, legal, deixa eu ver aqui o seu nome na lista. Ele entrou em contato comigo, disse que o teste era para a personagem que é filha do meu pai e perguntou se tudo bem para mim, e eu disse, claro. Falou depois com o meu pai e ele respondeu: ‘Não vou abrir uma porta pra ela, mas também não vou fechar, se ela conseguiu sem você saber quem era, eu acho incrível’. E eu fui fazer o teste, online também, estava muito nervosa, e passei. 

A Martina é brigona, não leva desaforo para a casa, o que mais a encanta nela? Ela tem essa coisa bastante diferente de mim, essa energia muito vibrante, pra briga mesmo, pra enfrentamento. Mas o que me encanta muito nela é saber a vulnerabilidade que tem por trás. As inseguranças que ela tenta esconder com essa marra toda. Ela é muito assertiva, sabe exatamente o que quer, mas quando entra especialmente no campo do romance, pra mim é muito especial o quão inapropriada ela se sente. E é isso, a resposta dela é ir para o embate quando ela se sente inapropriada, muito diferente do que eu vivenciei na minha vida. Então é muito legal eu conseguir transmitir essa briga, essa marra, essa agressividade, quando você não sabe o que fazer. Acho que é o que eu mais gosto nela.

Você comentou que é muito distante da Martina, então, de confusão você prefere ficar longe? Eu sou mais de conciliar do que de partir pra cima. Eu sou formada em Psicologia também, então pra mim a conversa é sempre em primeiro lugar. Mas foi legal estar vivendo um pouco a vida dessa garota que não pensa antes de falar porque me deixou um pouquinho mais assertiva também. A gente vive muito dentro da nossa cabeça e, às vezes, a gente se perde aqui dentro e esquece da nossa assertividade. E ela é assertiva, eu acho que eu consegui trazer isso e espero que permaneça comigo, porque tem seu trunfo também, saber o que você quer, conseguir colocar o pé no chão, com certeza e sem medo do que as pessoas podem pensar a respeito. Ela pensa um pouco menos nisso, isso é bom também, eu vejo essa positividade nisso.

O bacana é que muita adolescente deve se identificar com a Tina, de ter essa casca por fora, da durona, mas por dentro ter essa vulnerabilidade, né? É muito legal porque ela tem esse lugar romântico, claramente tem um interesse romântico ali por um cara, e, à princípio, ela não é o que se espera de uma mocinha romântica. Ela não precisa de alguém para defender ela. Eu acho isso importante de ser mostrado também. Dá uma quebrazinha ali do que é esperado e com certeza isso abarca mais gente, especialmente quem não se via na TV antes. Aquela moça que está apaixonada e tal, mas que não acha que o cara tem que defender ela, não espera que defenda, acho que é essa pessoa que estou representando ali e acho que tem muita gente se reconhecendo.

O que acha mais bacana desse encontro da Tina com o Tigrão, que já tem até hashtag #tigrina? O que me chamou muita atenção é que eles têm personalidades muito parecidas, são esquentados e não levam desaforo pra casa. E não é à toa que o primeiro encontro deles é com um esbarrão, que poderia terminar numa briga, mas tem um reconhecimento ali. A gente até conversou sobre o quanto o interesse não surge justamente porque você briga com alguém que esbarrou com você, e a pessoa não recua, ela vem pra cima. Acho que isso chama a atenção do outro no momento em que se encontram. Até então estão acostumados a brigar e a outra pessoa recuar e, de repente, eles brigam e a outra pessoa responde. Isso instiga, isso gera um reconhecimento na hora. 

Foto: Vicente Brichta

Vamos falar um pouco desse encontro em cena com o seu pai. Eu participei da coletiva online e ele disse que no set decidiu separar bem o pai, do colega de trabalho. E ele até brincou que não sabia como você ia reagir... Como foi essa experiência pra você? É um trabalho muito subjetivo, de concentração. E eu tava aprendendo a lidar, o que precisava para me concentrar, o que me garantiria um bom dia de trabalho. Foram tentativas diversas, ah, tem que ler entre uma cena e outra, ah, isso não deu certo... A gente vai descobrindo o nosso método. E o meu pai sempre me deixou aberta pra tudo, desde a escolha da profissão, até que curso que eu queria fazer. Então nesse trabalho, acho que eu nem me impressionei muito com esse respeito ao meu espaço, o respeito ao espaço de descoberta que ele me deu. Acho que foi a melhor coisa possível, é isso, a gente está lá trabalhando numa mesma função, são dois atores, na hierarquia ele não está numa função de direção, que seria diferente. E era um trabalho subjetivo, não teria muito espaço para dizer, assim que se faz ou assado. A gente gostava mais de conversar sobre a experiência do ator, o que é a construção de um personagem, num lugar bem filosófico, algo que a gente já fazia quando eu estava teatro. Eu sou muito nerd, levava pra ele, ele trazia o que achava. Mas nunca num lugar muito imperativo. Meu pai é bem relax nisso, não tem uma direção focal e me deixou também tranquila para ao longo do processo cada hora tentar uma maneira diferente de abordar ou de pensar uma cena. Porque eu entendi que não tem uma resposta definitiva no trabalho do ator.

Depois de todo esse processo, fim das gravações e agora a trama no ar, como foi que a família viu a sua estreia. O Vladimir Brichta e a Adriana Esteves deixaram um pouco de lado o olhar técnico de dois dos maiores atores da nossa dramaturgia para só vibrar como pais orgulhosos ou não? Eu já assisti com eles e também com amigos. E no geral eu escuto mais os amigos sendo muito encantados. Meus pais estão gostando muito, mas eles estão com uma visão técnica, eu sinto esse lugar dessa indicação meio técnica. Não indicação porque a gente já gravou tudo. O que eu estou absorvendo, por mim mesma, pelos amigos, pelas respostas na internet, pelos meus pais, eu estou guardando para um próximo trabalho. Para a Tina está fechada a história, então não dá muito para ser assertivo nesse lugar, ai, esse traço dela é interessante, tenta abrir, agora não adianta mais. Mas meus pais estão dando uma resposta muito positiva, o que sempre me deixa feliz, mas com o seu lugar de quem vive essa profissão há muito tempo. E os meus amigos que são formados eu já sinto um lugar mais, ah, a minha amiga lá, do que um lugar técnico...

Foto: Divulgação

Muita gente às vezes não quer nem ouvir falar na profissão dos pais quando tem que decidir sobre qual carreira seguir. Você cresceu vendo o seu pai e a Adriana trabalhando. Em algum momento você quis ficar longe disso ou desde o início sentia que era ali o seu lugar? Eu comecei a estudar em 2002, tinha 5 anos. E lembro de ficar muito encantada com o cheiro da coxia, eu dizia, é o melhor cheiro que tem, uma mistura de laquê com ansiedade e eu sei o que eu vou fazer, estou animada para fazer. Eu gostava, dizia que queria viver daquilo, mas é muito louco, por mais que os meus pais tivessem isso como profissão, demorou para eu entender que era uma profissão palpável, possível. Eu só achava completamente divertido, era a melhor sensação pra mim fazer uma peça no final de um curso. Foi em 2016 que eu cheguei a conclusão que eu queria fazer disso a minha profissão. Eu entrei em outra faculdade, psicologia, dizendo que não era o plano A, era B, querendo a atuação. Eu nunca neguei que queria, talvez tenha ficado nervosa no início, nessa transição entre o ensino médio e a escolha profissional. Cheguei a botar a psicologia na frente, foi o único ano que fiquei sem estudar atuação, em 2012, e senti muita falta. Falei, quer saber, vamos admitir isso. Por um lado eu posso dizer que eu nunca duvidei, por outro eu consigo apontar esse momento que deu um pouco de medo.

Você cresceu numa família de dois grandes atores, famosos, o público acompanhou a história do seu pai na questão da disputa por sua guarda, ainda bebê, quando a sua mãe faleceu... Mas a gente percebe você muito centrada hoje. Isso pode ter a ver com o fato de você conviver com dois artistas e saber o que realmente é essencial para ser ator? Eles também são pessoas muito centradas em passar pra gente o amor que eles têm pela profissão. E eu tentei ao máximo absorver isso e eu acho que em alguma medida eu consegui. Só pelo fato de ver o quanto que eu tratava aquele lugar, a experiência de fazer essa novela, com a proteção desse lugar, lembrar que é um trabalho, de se sentir honrado por estar fazendo esse trabalho, todo o dia ir lá, fazer e contar a história. Acho que diminuir um pouco tudo o que pode ter ao redor. E isso é fruto de eu olhar para os meus pais e ver o amor e a dedicação deles de todo o dia.