Nando Brandão sobre morte de Lucas, em Amor de Mãe: “Foi surpresa, coração acelerou quando li”

Intérprete do advogado cita desafio com papel e exalta o fato da trama ter metade do elenco com atores negros


08 de abril de 2021 00h33

Foto: Guto Costa

Por Luciana Marques

Aos 12 anos, Nando Brandão fez a sua primeira peça. Desde então, descobriu que só seria feliz se seguisse o caminho das artes. Mesmo sabendo das dificuldades, ele nunca desanimou. Entre os “nãos” em testes, sempre se virava. Ele já foi garçom, editor de vídeo... Recentemente, o ator, hoje com 33 anos, agarrou com unhas e dentes uma oportunidade e tanto: de viver o advogado ambicioso Lucas, que trocou o escritório de Vitória (Taís Araújo) para trabalhar com o vilão Álvaro (Irandhir Santos), em Amor de Mãe. Esta semana, ele foi assunto nas redes sociais com o assassinato de Lucas. “Foi o personagem mais difícil da minha carreira até o momento. Ele é de muitas camadas, passeou pela ambição, redenção, arrependimento”, avalia.

A morte do advogado foi uma surpresa para o ator.“Quando eu li a sinopse, meu coração deu uma acelerada”, conta. Nando diz que se dentro da história, Manuela Dias achou que era o caminho mais coerente para o personagem, ele acredita que ela tenha razão. E ele não exalta só o texto da autora, mas também o fato da novela ter quase metade do elenco composto por atores pretos. A maioria sem ser estereotipado, como no caso de Vitória, vivida por Taís Araújo, a mais bem-sucedida das protagonistas na história, e do próprio papel de Nando. “As pessoas pretas que veem a novela podem pensar “caraca, um advogado preto na novela, que legal! Eu também sou ou eu posso ser ou eu quero ser!””, diz o ator, que está no elenco do longa Quem vai ficar com Mário e também de uma série de streaming. 

Lucas (Nando Brandão) pouco antes de ser assassinado, em Amor de Mãe. Foto: Reprodução Globo

Como você sentiu a repercussão nas redes sociais e até de amigos seus da morte do Lucas? Hoje em dia tudo se reflete em engajamento nas redes sociais, e eu tenho tido um aumento considerável de seguidores no Instagram, E tenho recebido muitas mensagens. Eu também tenho uma conta bem ativa no Twitter, onde eu gosto de ler e ver a reação do público no momento da cena. Respondo todo mundo. Eu adoro interagir com o público por lá. Por isso, posso dizer que nem o público, nem meus amigos suspeitavam da morte do Lucas. Ninguém imaginava que ele ia morrer. O pessoal torcia ali pela redenção com a Vitória, pra ele ajudar a Vitória a pegar o Álvaro. E uma coisa muito legal que surgiu, foi que o pessoal esperava que ele terminasse com a Verena (Maria).

Foi uma surpresa ver na sinopse que ele morreria? Eu confesso que foi uma surpresa sim ver que ele morreria. Confesso que quando eu li a sinopse ali meu coração deu uma acelerada (risos). Eu achava que poderia acontecer várias coisas com o Lucas. Pra mim, a morte estava ali no fim da lista, mas sim, foi uma surpresa!

Foto: Guto Costa

Algumas pessoas se manifestaram nas redes pedindo para os autores pararem de matar personagens negros. Qual a sua opinião sobre isso? Amor de Mãe foi uma novela muito importante para a história da televisão e para a dramaturgia brasileira. Uma novela das 9 em que uma das protagonistas, e a mais bem sucedida delas, é uma atriz preta. E quase metade do elenco é composto por atores pretos, que tem personagens como o meu, um advogado bem-sucedido, e o fato dele ser preto não era pauta naquele momento... Somos um povo que estamos cansados de ver nossos corpos na televisão, e é muito importante a gente falar sobre isso. Porém, a Manuela Dias precisava dar um desfecho coerente pra cada personagem. E se dentro da história dela a morte realmente era o melhor caminho, eu acredito que ela tem razão.

Por que você acha que um jovem advogado como ele, de origem humilde, que chegou onde chegou, acabou aceitando trabalhar com um mau-caráter e empresário corrupto como o Álvaro? O Lucas sempre foi um cara bom. E acredito que ele fez Direito por acreditar na Justiça e lutar pelo o que ele acredita ser o certo. Só que quando ele começa a trabalhar no escritório com a Vitória e vê a própria chefe tomando atitudes não tão coerentes e honestas, acredito que no dia a dia ali, ele tenha se corrompido, achando que essas condutas questionáveis eram ok. Eu acho que o dinheiro corrompe. Muitas pessoas mudam com o dinheiro e acho que esse foi o caso do Lucas sim. Mas acho que ele teve tempo de perceber que estava do lado errado da história, pelo menos!

E para você, como ator e para a sua carreira, como foi viver um papel que teve essa curva tão grande? O Lucas foi o personagem mais difícil da minha carreira até o momento. Ele é um personagem de muitas camadas. Ele passeou por muitos momentos diferentes como ambição, redenção, arrependimento...  Então, eu tive que buscar muitos lugares dentro de mim. Porque acredito que todo mundo não é 100% bom ou ruim, todos temos essa dualidade dentro de nós. Poder viver o Lucas, um cara ambicioso, que foi capaz de qualquer coisa pra conseguir atingir seus objetivos e trazer pro Nando, foi muito legal! Pra mim esse é o grande barato de ser ator. Acredito que a gente vive várias vidas dentro de uma história, e isso e muito legal.

Foto: Guto Costa

Na pele do Lucas, você viveu um advogado bem-sucedido. Na sua opinião, o mercado já entende a importância desse tipo de representatividade ou ainda falta muito? Acho que cada vez mais a gente vai ocupando os espaços, né? Saindo cada vez mais de personagens estereotipados. Isso é muito importante porque a gente precisa se ver! A gente precisa ver no outro um personagem bem-sucedido como o Lucas. Então, acredito que cada vez mais a televisão têm aberto espaços para as pessoas pretas terem a visibilidade que merecem. Ainda não é suficiente o que temos hoje, mas estamos numa curva ascendente muito bacana.

Como foi a sua descoberta de que queria seguir a carreira nas artes? Eu acho que a descoberta das artes na minha vida foi quando eu tive noção o que era viver, eu acho (risos). Porque eu me lembro desde criança querer performar, atuar, cantar, dançar... Meu pai sempre gostava de filmar a gente, de tirar foto, então eu tenho muito registro dessa minha infância artística, vamos assim dizer! Com 11 anos eu disse à família que queria fazer teatro e meu pai me colocou na escola. Fiz minha primeira peça com 12 anos. Naquele momento eu soube que aquele era o meu lugar e que eu iria ficar ali por um bom tempo. Estar no palco, com o público e com as luzes ligadas, aquilo ali sempre me encantou muito.

Enfrentou muito perrengue para conseguir um espaço? Eu sempre quis ser ator, né? Então eu sempre soube que eu teria que me virar para saber onde teria os testes, se ninguém me atendesse, ok, volto outro dia, era por aí... Eu sabia que eu iria passar por isso. E com 18 anos eu fui pra Cal (Casa das Artes de Laranjeiras), comecei a estudar teatro e eu soube de um teste pra uma peça infantil no Retiro dos Artistas, e eu fui fazer, enfim! Eu sempre corria atrás de absolutamente tudo, com muito empenho e dedicação! Então acredito que ser assim sempre me trouxe muito retorno! E ouvir elogios de colegas e mestres sempre me motivou a não desistir! Claro que passei por muitos perrengues, tive que trabalhar com outras mil coisas que não tinham nada a ver, sempre chegava em casa muito tarde porque pegava várias conduções... Mas eu gostava desse “corre”, sabe? Eu me sentia vivo e motivado a alcançar o lugar que eu sempre soube que estava reservado pra mim.

A gente vive um momento difícil, em que a cultura, que já vinha sendo desmontada, sofre muito. Mas muitos atores, produtores, estão erguendo as mangas para continuar fazendo arte. Você já tem projetos para esse ano, planeja algo? Pois é, com a pandemia a gente teve que se reinventar, né? Surgiram muitas peças online, e eu fiz uma delas. Pra mim foi um grande desafio lidar com a internet e interpretar sozinho com a outra pessoa na casa dela, foi bem desafiador. Na verdade é uma nova possibilidade que se abre, já que a arte nunca morre. Tenho aí um filme pra estrear, que é o Quem vai ficar com Mário, que deve estrear nos cinemas assim que tudo melhorar, mas que também irá para algumas plataformas de streaming após a estreia no cinema, e também estou em uma série em uma plataforma de streaming, que aí é novidade, vocês vão ter que ficar ligados!

Agradecimento – Stylist: Paulo Zelenka